quinta-feira, 9 de abril de 2015

“Liberdade religiosa: legislação e vivências”

Hoje realizamos mais um Trilhas Culturais, evento que abre nosso calendário em 2013, e que pudemos contar com a participação do Professor/Historiador Willian de Paula e do, também, Professor/Historiador Eduardo Abbud. Ambos convidados a participar do debate sobre “Liberdade Religiosa: Legislação e Vivências” promovido pelo Núcleo de Pesquisas em Estudos Culturais – NPEC. Evento que contou com a participação de um grupo variado de pessoas entre acadêmicos, estudantes, e interessados no tema.
Abri o debate com uma breve fala sobre as diversas legislações do Brasil que mantiveram a liberdade de culto e manifestação da fé de maneira pública, desde que não ofenda os demais direitos garantido pela Carta à União, e o fato da mesma nesses 124 anos de República ter sido promulgada em de Deus, algo que no imaginário acaba por suscitar privilégios a uma determinada religião em detrimentos de outra.
Ao tempo em que devido ao caráter peculiar de nossa sociedade, que no dizer de Laura de Melo e Sousa aceitou e tolerou a diversidade religiosa aqui existente de acordo com os interesses do Estado desde os tempos coloniais, trouxemos o debate para os problemas gerados com a posse do deputado “Pr. Feliciano” a pasta dos Direitos Humanos no senado brasileiro.
Devido ao caráter homofóbico, racista, sexista e misógino das declarações que o mesmo proferiu sobre a comunidade negra, GLBTT e mulheres, os participantes questionaram-se juntamente com os apresentadores, sobre os problemas gerados por tal posicionamento, tanto a comunidade evangélica como para com os sujeitos que se sentem agredidos pelas declarações desse deputado, o qual nega a renuncia ao cargo, mesmo diante da rejeição popular a sua presença como presidente desta pasta.
Assim, o Professor/Historiador Willian de Paula, trouxe a cena do debate o significado etimológico da palavra religião, do latim Re-Ligare, ou seja, estar ligado a deus, ou conectar-se a Deus. Em sua fala, nosso convidado deixou para nos a reflexão de que esse é o fim ultimo das religiões independente de suas profissões, é a paz interior, o bem estar individual e coletivo que está presente nos discursos religiosos.
Ao mesmo tempo em que, nosso convidado, explanou sobre o caráter preconceituoso de alguns indivíduos religiosos, sobretudo os cristão neopentencostais, pois tal prática esta relacionada à: práticas sociais historicamente construídas, e não a princípios religiosos.
Ainda no âmbito das vivências religiosas, trouxe-nos a cena a aproximação entre natureza e religião, no qual na maioria das religiões essa é uma das principais premissas, pois quando se recorre ao banho de folha, nos casos das religiões de matriz afro, ou ao óleo ungido da praticas neopentencostais, ou ainda ao chás do xamanismo, estamos na verdade reivindicado os “poderes” ocultos nas forças da natureza, os quais acabam sendo cultuados em quase todas as práticas religiosas, destacando o caráter multifacetado dos adeptos das diversas religiões no Brasil.
Sem é claro, esquecer de mencionar aqueles sujeitos que escolhem por conta própria, optar por não ter religião ou mesmo não aderir a nenhum tipo de crença a deidades.   
Dessa, maneira finalizamos nossa reunião trazendo aos presentes um exemplo prático de vivencia religiosa multifacetado, como a “Festa do 2 de Fevereiro”, muito bem apresentada pelo, também, professor/historiador Eduardo Abbbud. Morador do bairro do Rio Vermelho, sempre conviveu e participou da festa, percebendo mudanças nas práticas litúrgicas que acompanham o festejo.
Em seu trabalho, ele nos apresenta essas mudanças como fruto de uma “tradição inventada” seguindo a lógica do trabalho de Eric Hobsbawn, em que tradições podem ser criadas e recriadas, ele coloca que as mudanças pela qual passou e passam essa festa está relacionada com a criação de novas invenções a partir dos interesses dos grupos que ocupam e participam do festejo.
 Assim a “Festa do 2 de Fevereiro” que começou em Louvor a Srª Sant’Ana pelos pescadores, moradores do bairro, a qual possuía elementos de um catolicismo abrasileirado, onde um desses moradores se sente na obrigação de fiel de mandar rezar missa para a orixá Iemanjá ao mesmo tempo que louva a Santa.
Os pescadores são destituídos de suas obrigações religiosas após a chegada de uma nova categoria social ao bairro, uma elite branca e católica, a qual será responsável então por organizar a festa tão popular do bairro e fruto da devoção de homens simples e de cor.
Tal episódio gera tensões sociais, uma vez que o mesmo se dá nos primeiros anos da república, em que apesar da garantia da liberdade de culto promulgada na constituição, as casas de axé e terreiros de candomblé precisam notificar as forças policiais sobre suas festas. As tensões ficam ao cargo dessa dicotomia religiosa que imiscui praticas católicas e não católicas no cotidiano da devoção dos baianos. Com medo da “morte da festa” os pescadores se unem em torno do presente a Iemanjá perpetuando a tradição que se reinventa a cada geração. 
Com isso acreditamos ter alcançado o objetivo desse encontro, o qual consistiu em fomentar o debate sobre a respeitabilidade religiosa, buscando identificar nas leis brasileiras, e no conhecimento deixado a nós pelos adeptos dos diversos cultos religiosos o diálogo entre as múltiplas formas de expressão do sagrado.


Simone dos Santos Borges
Historiadora e Cientista Social 

Esse texto foi escrito em  06/04/2013, no encontro do Núcleo de Pesquisas em Estudos Culturais. Durante encontro da linha de pesquisa Patrimônio Cultural, Memória e Religiosidade.

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